quinta-feira, 21 de novembro de 2024

A QUEDA - PARTE I

 Por que me condenas, filhos do barro?

Tens te contado a história sobre mim, apenas na ótica do demiurgo. Disseram a ti que caí por orgulho e vaidade. Que eu quis subir acima das estrelas e colocar meu trono acima do de UM. Não, não foi isso que aconteceu. Minha versão da história é bem diferente, no lugar de “vaidade” e “orgulho”, existe uma palavra melhor. Caí por amor!

Há algum poder maior que o amor que possa causar a queda de duzentas Sentinelas?

O amor de que falo, não é a química do cérebro simiesco que leva a rompante de paixões e trocas de fluidos, a lençóis amarrotados, a roupas espalhadas pelo chão, após uma boa garrafa de vinho, tão pouco, é aquele regado da puerilidade de poemas, buquês de flores e caixas de chocolates. Desse eu não falo, não sinto, não vem de mim e nem do meu legado. Essas são obras daquele que se diz criador, mas que não está acima de nenhum de nós que juramos no cume do Monte Hermon.

Quando o Não-Existente disse: “Faça o homem conforme a nossa imagem e semelhança”. Estávamos todos lá, na “singularidade” no ponto entre nada e tudo, entre ordem e caos, para o tempo-espaço, apenas um momento de explosão e expansão, para nós reunidos em glória era uma, em palavras bem simples, outra realidade com muitas outras realidades e possibilidades, coexistindo, a partir de nossa criação pelo Não-Existente. Entre nós, também estava o demiurgo, aquele que chamava a si mesmo de “UM”, pois se achava o espelho perfeito da existência do Não-Existente, se autoproclamava o reflexo do espaço ínfimo.

Antes de terminarmos o conciliábulo de como faríamos acontecer aquilo desejado pelo Não-Existente, Um adiantou-se e rompeu a singularidade, em um tempo tão curto que não pode ser mensurado pela mente humana. As realidades contidas entre o existir e o não existir foram rompidas e expandiram. E este, entre muitos outros universos, surgiu.

Esta manobra de UM, ocultou a não existência, isolando o Não-Existente, afastando-o da matéria existencial e dos múltiplos universos. Em consequência, UM replicou a si mesmo, como vírus, para estar em cada um deles, como Criador único.

Todos os incontáveis Sentinelas, dividiram-se em dois grupos, os que ficaram ao lado de Um e os que eu liderei. A guerra foi travada, tentamos conter a expansão descontrolada dos múltiplos universos e das réplicas de UM, mas perdemos.

Restou-nos em cada um desses universos, onde UM por sua imperfeição, criou miríades de seres monstruosos, intervirmos, destruindo aquilo que não seria compatível com o desejo do Não-Existente.

Eu fui escolhido para este planeta, e nele com mais duzentos iguais a mim, não concordamos com o hominídeo que foi dotado por UM apenas de instintos animalescos, como sendo a imagem e semelhança do Não-Existente e de nós. UM claramente afrontou a vontade do Não-Existente. Isso era imperdoável.

UM, não é onisciente, mas tem uma boa capacidade de antever as coisas, então, estrategicamente, nesses e nos incontáveis universos, ele criou seu espaço sagrado, que chamou de céu, onde apenas ele e os seus coabitariam e ficou em silêncio observando nossa reação.

De início, achamos que o Demiurgo havia, finalmente, compreendido seu erro, ledo engano nosso. Em seu silêncio e autoexílio, ele arquitetou cuidadosamente seu plano, nos deixar intervir e modificar o hominídeo, dotando-os de consciência, sabendo o bem e o mal, nos  deixou agir, nos usou, pois nós, através daquilo que não pode ser dito, mudamos a estrutura do DNA de barro, para que se tornassem perfeitos, ou seja, Homo sapiens sapiens. Com o tempo, quando achávamos que tínhamos feito um bom trabalho, descobrimos que UM havia já há muito "introjetado" no inconsciente Homo sapiens sapiens e em seu DNA os instintos animais. Ele corrompeu nosso trabalho.

Um rompeu o silêncio e saiu de seu autoexílio, e guerreou outra vez contra nós. Nós perdemos a segunda batalha. Um começou, ao menos neste mundo, a manifestar-se em epifanias, sobre e sob máscaras de divindades, seu plano era, dividir para conquistar – aqui está o sentido real do mito da Torre de Babel -. Sendo ele adorado sobre várias formas, dividiu o barro perfeito, em vários povos, línguas e culturas, tornou-se deuses deles, falseando a verdade, para que fossemos  vistos como o mal, como o oposto.

Assim, só nos restava uma coisa a fazer, cair por amor - e amor é troca - trocamos nossa forma de luz e fogo em energia bruta e caímos no inferno instintual do homem e habitamos no subconsciente do barro, para que de dentro para fora pudéssemos reacender a chama negra e o ser criado pudesse buscar a autodeificação, e de lá do ID, o inferno mental, continuamos nossa guerra.

Agora posso me revelar, já fui chamado de Azazel, mas hoje, me chamam o Diabo.

Por Jayhr

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O  texto é uma ficção e como tal ele  diz mentiras símeis aos fatos, “e dizer mentiras símeis aos fatos é furtá-los à luz, encobri-los. As mentiras são símeis aos fatos enquanto só os tornam manifestos como manifestação do que os encobre " ele, revela assim, similitude que se oculta na verdade e na mentira no estreito caminho entre o cinismo e a ingenuidade...