RESPONDENDO A DÚVIDAS IX

Era mais uma noite tranqüila, tinha acabado de chegar da academia (to ficando definido já), e como de costume fui verificar minha caixa postal, deparei-me com mais um e-mail, vinha de alguém cujas iniciais são G.R.L, mensagem longa, enfadonha, eivada de acusações  veladas, que  não vale apena repetir, pois seria demasiadamente exaustivo, preferir optar por  sínteses bem resumida dos temas polêmicos de seu  e-mail e respondê-los dentro dos meus parcos conhecimentos.

Síntese I

“Venho de uma Linhagem de Sacerdotisas Celtas... minha bisavó chegou ao Brasil no inicio do século XX, fui iniciado nos mistérios Celtas ainda criança por minha avó... por isso, posso falar sobre a cultura e religião pagã Celta... Por isso me comunico com os seres e as forças da natureza”

Parabéns pela sua pretensa linhagem, pena que não a cantou como faria qualquer Bruxo. Eu sou mais modesto, minha linhagem no máximo teve origem a partir dos degredados e colonos que veio das Caravelas que aqui se miscigenou com o povo das Matas e com os que vieram forçados e escravizados nos ventres escuros dos navios negreiros. Portanto sou fruto da raça nacional, mistura bela que desaguou num caldeirão de cultura e sangue que faz de nosso povo um dos mais religiosos e místicos do planeta. SOU BRASILEIRÍSSIMO, E BAIANO DE CORPO, ALMA E FÉ.

Para mim, que sou um leigo, é difícil entender, como alguém que nega a verdadeira linhagem do  ventre e do sangue e que lhe deu origem, como alguém que despreza seus parentes mortos por puro preconceito e vergonha da religião e espiritualidade de seus antepassados, como alguém que renega a cultura, a espiritualidade, a raça e o solo de onde vive, pode se comunicar com as forças da natureza e com os seres desta terra brasilis, no mínimo é contraditório, para não dizer irracional.

Eu poderia até citar as incongruências entre sua forma de praticar sua religião (clima,  as estações,  geografia, fauna, flora, línguas, herança cultural, folclórica, espiritual e religiosa, astrologia e astronomia) e a natureza (local) que você diz se comunicar e conectar. Mas não o farei, acredito que mais cedo ou mais tarde, você mesmo vai perceber que está  indo contra as forças desta terra e da natureza dela e nesta briga, ela tende a esmagar quem se coloca contra ela.

Mas fazer o que se no meio de sua espiritualidade há gente que prega o “Culto a fertilidade” e, no entanto “Castra seus animais de estimação para que não procriem e tomam remédio para evitar a manifestação da fertilidade (gravidez) e usam camisinha para o mesmo fim”. Mas mesmo assim, não vou julgar sua espiritualidade, cada qual acredita no que lhe apraz.

Quanto as minhas avós, uma era de religião Afro-brasileira e outra era Católica, portanto, diferente das suas, as minhas  não me iniciaram nos segredos Célticos e sim nas crenças e formas de suas próprias religiosidades e disso faço bons usos, sei muita oração e reza forte, bem como, ebós e feitiços que de fato funcionam.

Síntese II

“Você se diz da Tradição Ibérica....Você deveria ler mais os livros (citou algumas obras) para saber e compreender um pouco sobre os Celtiberos... ”

Pois bem, G.R.L, fiquei surpreso com sua indicação de leitura a mim, você teve a cara de pau, confundindo meus 41 anos de idade como se fosse 14 anos, de mim indicar estes livros como sendo leitura base para conhecimento do celtismo, não repetirei a sua lista aqui por ter vergonha, pois são, literaturas que infelizmente já tinha até lido, e as quais são sem fundo algum, sem nenhuma base, livros que resumem a cultura dos vários povos de origem celta a um amontoados de bobagens e que podem ser facilmente achados nas estantes das livrarias dedicadas a “es(quis)oterismo .  

Retribuo a você à indicação, citando apenas 03 livros que são totalmente contrários  aos que você me indicou:

1. Os Celtas (T.G.E Powell);

2. Uma Luz Sobre Avalon (Maria Nazareth Alvim de Barros);

3. Os Druidas (Ward Rutherford).

E por favor, depois de ler esses poucos livros, quero ver se suas crenças ancestrais celtas supostamente herdadas de suas bisa e avó vai se sustentar.  

E como sou chatinho, indico também, para você começar a entender um pouco dos mistérios da Península Ibérica, o livro:

“Portugal Terra de Mistérios (Paulo Alexandre Loução)”

Síntese III

“... Muito me admira que alguém como você, que adorava os Deuses Antigos (Pagãos), um Sacerdote de Hécate e Pã, agora adora o Deus Cristão, que é uma entidade patriarcal, raivosa, vingativa... Um Deus que se vinga de seus seguidores, um Deus cuja Igreja perseguiu os Pagões e as crenças antigas... E no lugar da Deusa-Mâe, coloca no seu altar o símbolo maior de submissão patriarcal e de humilhação feminina que é a Virgem Maria...”

Quanto a IHVH, IAVE, JEOVÁ ou JAVÉ:

Observei o tempo do verbo e a forma afirmativa das frases (em negritos) que você usa a cerca da divindade criticada.

Assim suponho, em linguagem mais simples que você tem a deidade judaico-cristã viva dentro de si, ou seja, as raízes  da cristandade continuam vivas e pulsantes por debaixo da expressão visível de suas práticas.

Mesmo assim, para ser mais chatinho ainda, trarei a baila algumas das características da deidade que você cita:

·         deus da ira (Salmos 7:11 e Deuteronômio 32:22)

·         deus da guerra (Ex. 15:3; I Sm. 17:47; Is. 14:21)).

·         deus da vingança:  (Na. 1:2; Jr. 18:10; II Pd. 2:19). 

·         deus do ódio (Sl. 78:59; I Jo. 3:15).

·         deus da doença, das pragas e da peste (Hc. 3:5 ; Dt. 28:61-63).

·         deus das maldições (Dt. 28:15-68).

·         deus ciumento (Is. 1:4)

·         deus que produz o mal (Jr. 11:17; Jr. 21:10; Jr. 18:11; Jr. 44:27; Dn. 9:14; Am. 3:6). 

·         deus do amor (1João 4.7-8)

·         deus que entrega seu filho em sacrifício para salvar o mundo (João 3:16);

·         deus encarnado e sacrificado (1 João 4:2; João 10:30; 14:10; 15:23)

·         deus que supre as necessidades (Filipenses 4:19);

·         deus criador (Gn 1:1; 2:2 -3)

·         deus da esperança (Sl 62:5; Sl 65:5; Sl 71:5);

·         deus que promete vida eterna (Tito 1:2)

Eu poderia passar horas citando as características, qualidades ou regências da divindade judaico-cristã, mas isso já chega por enquanto. 

E, também poderia, detalhar dentre os panteões mitológicos mais celebrados por sua expressão visível de fé no Brasil, facilmente, paralelos com a divindade acima citada, mas não o farei, não lhe tirarei o oportunidade de pesquisa e aprendizado. E para facilitar seu trabalho ainda dou o seguinte toque:

“Consulte as diversas mitologias pagãs em literaturas sérias e depois me diga se nestas mitologias encontrou  divindades que contenha essas qualidades, regências, funções ou características?”

E lhe facilitarei o trabalho mais ainda, dando o seguinte adendo:  

“A diferença é que no sistema politeísta adotado por você, fica difícil a mente concatenar essas características, pois na maioria dos casos, elas estão fragmentadas entre os vários deuses e deusas que compõem seu panteão pagão, e,  no monoteísmo judaico-cristão ela está presente em uma única divindade, sendo mais fácil de se enxerga”.

Partindo desta premissa, ficará chocado com o que vai descobrir, ou seja, que no fundo as divindades são todas tão humanas e quase que idênticas no modo de agir.

Sabe o que falta a você? Ler mais, refletir muito e falar menos de verdades absolutas. Pois, se lesse mais, ia pensar duas vezes antes de sustentar verdades suas pseudo-absolutas acerca da divindade alheia, iria olhar o próprio rabo antes de criticar o rabo dos outros, pois vai perceber que a maioria das afirmações religiosas que fez no e-mail não se sustentam diante de um livro didático do 9º ano.

Só mais um detalhe, quanto à perseguição da Igreja, não lhe tiro a razão total, mas lhe peço que volte na história (literatura) e pesquise o que as religiões pagãs fizeram com os cristãos (sem sucesso) quando a crença em Jesus ainda engatinhava.  

A diferença consiste em que o perseguido (cristão) aprendeu a superar o perseguidor (pagão) e venceu. 

Se você entender o processo histórico fora do foco da fé cega e da intolerância que tanto repugna nos cristãos mais pratica contra mim,  notará que era uma questão de sobrevivência, ou seja, era um ou outra fé.

Repito, o paganismo antigo fez o mesmo que Igreja Medieval. 

Não estou inocentando ou justificando a igreja medieval e sim, lhe pedindo que abra outro víeis de pesquisa e não se limite a tosca literatura sem bases que me indicou ou no que diz seus iniciadores.

Quanto a Nossa Senhora, você queira ou não, aos poucos ela vem ocupando os altares de Bruxas e Bruxos Tradicionais pelo mundo, pessoas que não vivem a intolerância religiosa e sim que sabem utilizar o “ícone da fé dominante” como o foco e fonte de poder, isso é um mistério e sobre ele nada mais pode ser dito. 

Quanto a minha crença atual (Catimbó-Jurema) ser Bruxaria, direcione suas criticas, os teólogos da Igreja, aos historiadores,  etnólogos, antropólogos , linguistas e quais outras autoridades acadêmica e lhe imponha que Bruxaria é aquilo que você aprendeu em seu grupo de paganismo, tenho certeza que conseguirá com provas fartas, persuadi-los a mudarem sua visões.  Faça um sessão mediúnica, e se comunique com “Câmara Cascudo” e diga-lhes que ele mente descaradamente em seu livro “Meleagro” ao dizer que o “Catimbó” é herdeira legitima da Bruxaria Européia no Brasil. Imagine a decepção dele, que estudou tanto e pesquisou tanto, teve uma vida dedica a isso e está completamente errado, e, errados estão todos os seus antecessores e os que os lhes precederam, pois são justamente eles que dizem aquilo que você renega. E Até que essa sessão mediúnica seja feita e o espírito ali chamado mude sua opinião com provas contundentes, para seu desgosto e de muitos seus cor-regionários  “CATIMBÓ” CONTINUARA SENDO BRUXARIA SIM, com a vênia de que PENSA EM CONTRÁRIO, E, funciona mesmo, quer você queira ou não, o feitiço do catimbozeiro funciona, e no catimbó, comungamos de fato com os ancestrais de nosso sangue e de nossa linhagem, no catimbó, eles continuam vivos através de nós e nos conhecemos o segredo da morte através dele,  isso não mudará porque você e alguns querem.

Viva sua fé, defenda sua fé com unhas e dentes, mas evite repetir a intolerância, respeito as crenças dos outros, respeite os deuses dos outros, pois pode ser que chegue (na minha visão) seu momento de iniciação real e ai saberá ultrapassar o limite da religião humana, de deuses humanos e mortos com seus credos humanos e descobrirá a essência do caminho tortuoso de Elphame que nos leva a comunicação, interconexão e intercâmbio com o outro mundo e com os mortos de nosso sangue e linhagem real.

Até a próxima...